Em outro livro seu, Il Convivio, Dante, como no Banquete de Platão, ao utilizar-se do estilo dialógico no texto, coloca a discussão sobre as formas da arte poética de seu tempo e cria distinções entre a alegoria poética e a alegoria teológica, numa clara desmonstração da influência de Tomás de Aquino sobre seu conhecimento. Concluído, segundo os estudiosos em 1308, Il Convivio, é uma enciclopédia em volgare, uma deturpação consciente do latim dos textos clássicos usado pelos eruditos da época, e que, dizem, deu origem à língua italiana.
Todo o discurso de Dante parece ser político, religioso – ele se põe contra o poder excessivo de Roma, do Papa e dos Cardeais da Cúria, que tenderam à temporalidade terrena e se entregaram ao gosto pela matéria, pelo ouro, pelo próprio poder, negando a doutrina cristã. O foco das discussões era exatamente se deveriam ser, a Igreja e o papa, possuidores ou não de bens materiais. Os partidários Dominicanos (considerados deturpadores dos ensinamentos de São Domingos, fundador da ordem) defendiam a riqueza material da Igreja e do papa, ao contrários dos Franciscanos (seguidores da doutrina de São Francisco de Assis, postura de Dante) que a queriam pobre.
Nessa época Dante elabora, também, De Vulgari Eloquentia, uma defesa “científica” da linguagem popular e o primeiro estudo de uma língua moderna (graças à sua proximidade com os filólogos, poetas provençais e estudiosos que pretendiam mudanças na Itália, bem como sua unificação político-territorial).
Era, sua época, a ante-sala do Renascimento, borbulhante de idéias e preconizadora das mudanças, muitas das quais radicais, que estavam por vir. O próprio feudalismo, sistema sócio-político e econômico que se mantivera, até então, ancorado nas relações de força do senhor feudal e do poder religioso dos padres sobre os pobres campônios e mercadores, já sentia, ainda que moderadamente, os ventos da mudança que apontavam para um novo Estado moderno europeu, em que novos pólos de poder e cultura haveriam de se criar.
Diz a história que bem cedo, daquela época doce de sua vida, a imagem recorrente da bela e eterna Beatriz, moça que conhecera numa festa na casa de FolcoPortinari, rico comerciante da região, passa a fazer parte de sua vida. Sempre que podia Dante tentava revê-la. A paixão fora fulminante e a imagem da menina era uma luz que se renovava em seu espírito a guiar-lhe os passos na escuridão, ele que perdera a mãe quando ainda contava treze anos de idade. Admirava Beatriz à distância não como a uma criatura mortal, mas como um anjo de Deus;era especialmente sensível à sua beleza física e sensual.
De natureza apaixonada e muito inteligente, ele que era de família mais modesta, seguramente se questionava como poderia pretender aproximar-se de moça tão rica? Quantas destas paixões impossíveis ocorrem ainda hoje em dia, e possivelmente um de nós já a experimentou ou sabe de alguém próximo que o fez; dado que torna esta faceta da história deste poeta singular semelhante a de muitos jovens de nosso tempo. Dante guardava sua paixão em segredo, pois a sabia impossível.
Apesar disto, também enamorou-se por outras moças, claro, mas escreveu seus primeiros poemas dedicados à sua musa secreta, o que certamente animou uma certa infidelidade e uma intrigante curiosidade em suas namoradas, que sentiam-se confusas, naturalmente, por não saberem bem o que exprimir pelo poeta a não ser, talvez, um misto de raiva, amor e compaixão.
Desta forma Dante passou a suportar a distância de sua amada causada pela diferença social, mas, diz a história, se conheceram e se cumprimentavam quando se viam nas ruas, nos templos. Nada mais do que isso, porém. Contudo, era a simples visão da amada o suficiente para que Dante escrevesse e sonhasse com ela, e a cada vez que a visse novamente sonhasse e tornasse a escrever sobre e para ela.
Parece claro que Dante assume que Beatriz representa mais do que uma simples mulher, e estudos comprovam que a ela foi feita uma comparação com a Verdade, a Beleza, com o Bem, assim como os fins ulteriores a que todos os filósofos se dedicam a procurar. De fato, Beatriz se torna o símbolo desta procura, deste ideal.
Deixa de ser “mulher de carne”, deixa de ser humana, e passa a se tornar uma espécie de ideal, uma guia ideológica e espiritual particular que lhe permeava o caminho da poesia trovadoresca de amor.