A poesia do início da Civilização Ocidental
Homero
Das duas epopéias que se encontram na origem da literatura grega, uma ilustra o poder de expansão da raça – evoca o estabelecimento dos gregos na costa da Àsia – graças à Ilíada, a Guerra de Tróia, notável episódio deste grandioso empreendimento, e que passou a ser o acontecimento simbólico da força conquistadora dos helenos.
A segunda epopéia focaliza elementos da outra qualidade dos helenos – a faculdade de adaptação que, acrescentada ao espírito de aventura fez com que esse povo apegado à terra se vergasse de tal forma às novas condições de existência que, mal despertou para a poesia, revelou-se capaz de conceber e de apreciar o poema do mar, que é a Odisséia.
Odisséia de Homero
O título do poema provém do nome do protagonista, o grego Ulisses (Odisseu). Filho e sucessor de Laerte, rei de Ítaca e marido de Penélope, Ulisses é um dos heróis favoritos de Homero e já aparece na Ilíada como um homem perspicaz, bom conselheiro e bravo guerreiro. A Odisséia narra as viagens e aventuras de Ulisses em duas etapas: a primeira compreende os acontecimentos que, em nove episódios sucessivos, afastam o herói de casa, forçado pelas dificuldades criadas pelo deus Posêidon (Deus do Mar – Netuno para os Romanos). A segunda consta de mais nove episódios, que descrevem sua volta ao lar sob a proteção da deusa Atena.
É também desenvolvido um tema secundário, o da vida na casa de Ulisses durante sua ausência, e o esforço da família para trazê-lo de volta a Ítaca. A Odisséia compõe-se de 24 cantos em verso hexâmetro (seis sílabas), e a ação se inicia dez anos depois da guerra de Tróia, em que Ulisses lutara ao lado dos gregos. A ordem da narrativa é inversa: tem início pelo desfecho, a assembléia dos deuses, em que Zeus decide a volta de Ulisses ao lar.
Há forte crença de que a Odisséia reúna temas oriundos da época em que os gregos exploravam e colonizavam o Mediterrâneo ocidental, daí a presença de mitos com seres monstruosos no Ocidente, para eles ainda misterioso. Pela extrema perfeição de seu todo, esse poema tem encantado o homem de todas as épocas e lugares. É consenso na era moderna que a Odisséia completa a Ilíada como retrato da civilização grega, e as duas juntas testemunham o gênio de Homero e estão entre os pontos mais altos atingidos pela poesia universal.
Odisseu, Rei de Ítaca (Ulisses) parte em viagem atrás de aventuras para conquistar e descobrir o além Mediterrâneo e sua bela mulher Penélope é assediada e pretendida por vários homens. Estes pretendentes intentam matar a Telêmaco, filho de Odisseu e convencem algumas escravas da casa a lhes facilitar um plano para tal. Penélope, espera a volta do marido e começa a tecer uma mortalha, com o que logra conseguir mais tempo enquanto mantém afastados os pretendentes. Muito tempo se passa e um mendigo surge à porta da casa. Telêmaco lhe dá abrigo e pede para uma das escravas cuidar do pobre homem.
Ela reconhece, por uma ferida na perna, seu antigo senhor Odisseu, mas este lhe ordena silêncio. Os pretendentes dizem a Telêmaco que deve matar o estranho indigente, mas este se recusa a fazê-lo ameaçando expulsar de sua casa aquele que lhe fizer mal. Odisseu fala com Euricléia, uma velha escrava fiel e ambos decidem criar um ardil para vingar a traição. Um concurso onde aquele que conseguir vergar o arco de Odisseu e disparar uma flexa se casará com a bela Penélope. Todos os pretendentes tentam, mas nenhum consegue e o mendigo se oferece para fazê-lo, no que é ridicularizado pelos demais. Odisseu dispara a flexa e se revela ante o espanto dos demais, e apesar dos insistentes pedidos de perdão mata todos os traidores e as escravas que com eles armaram o plano. Manda chamar Penélope que não crê em seu retorno, mas após descrever seu leito nupcial em detalhes, ela acredita e o recebe de volta.
O fato/poema é político e descreve o interesse de outros “partidos” gregos em dominar a Ítaca, representada por Penélope e cujo senhor é Odisseu.
V. Bérard – Introduction à l’Odyssée – Paris 1925
Notas e Introduções de Mederic Dufour et Jean Raison
Traduções : Antonio Pinto de Carvalho
Artes – V. Ballestar
Dante Alighieri seguramente leu e se inspirou muito na Odisséia de Homero para escrever seu poema A Divina Comédia. As suas peripécias pelo inferno, por exemplo, em que conversa com as almas de muitos danados mortos, amigos, conhecidos, homens e mulheres, é exatamente igual à narrativa grega homérica, em que pela voz de Odisseu numa passagem com o tirano Alcínoo que lhe dera abrigo, narram-se as conversas entre as almas dos mortos no Hades e o próprio herói do poema grego – Ulisses, ou Odisseu.
Basta ler o canto XI da Odisséia, em que o herói chega ao Hades de sombras eternas e conversa com o adivinho Tirésias seguindo conselho de Circe, a feiticeira,para notar a incrível semelhança (plágio? atualmente sim, mas à época, ao que tudo indica, perfeitamente possível). Em determindado momento Odisseu vê a alma de sua mãe e tenta abraçá-la três vezes e seguidamente não consegue – cruza os braços sobre o próprio peito vazio. O mesmo fato ocorre no Canto II do livro 2 – o Purgatório do poema dantesco -, em que o próprio Dante, aliviado por estar fora do Inferno e feliz por rever um amigo (o músico fiorentino Casella) tenta abraçá-lo, e agita os braços no vazio contra o próprio peito por três vezes. (nota minha).
A ILÍADA de Homero
Ilíada de Homero
O poema encerra grande volume de dados e pormenores geográficos, históricos, folclóricos e filosóficos, e descreve com perfeição os modelos de conduta e os valores morais da sociedade do tempo em que foi escrita a obra. Uma questão muito discutida é o fundo histórico do ciclo da guerra de Tróia. Possivelmente, sua origem remonta a reminiscências da luta, travada antes da invasão dória, no século XII a.C., entre povos de cultura micênica, como os aqueus, e um estado da Anatólia, o de Tróia.
É historicamente comprovada a existência de estabelecimentos micênicos na Anatólia, sem que se conheçam as causas possíveis da guerra. O mundo helênico a que se refere a Ilíada não parece circunscrever-se ao de uma época cronológica determinada. É muito provável que às lendas foram-se incorporando elementos de diferentes etapas da civilização, no curso de sua transmissão oral e até textual.
Aponta-se, por exemplo, a descrição de armamentos e técnicas militares, e até rituais, correspondentes a diferentes períodos históricos, desde o micênico a aproximadamente meados do século VIII a.C.
Cheio de dor pela morte do amigo, Aquiles esquece a divergência com os gregos e investe contra os troianos, vestido com uma armadura feita por Hefesto, deus das forjas. Consegue fazer recuar para dentro dos muros da cidade todos os troianos, menos Heitor, que o enfrenta, mas aterrorizado pela fúria de Aquiles, tenta fugir. Aquiles o persegue e finalmente atravessa-lhe com a lança a garganta, única parte descoberta de seu corpo.
Agonizante, Heitor pede-lhe que não entregue seu cadáver aos cães e às aves de rapina, mas Aquiles nega piedade, e depois de atravessar sua garganta mais uma vez com a lança, ata-o pelos pés a seu carro e arrasta o cadáver em volta do túmulo de Pátroclo. Somente com a intervenção de Zeus, Aquiles aceita devolver o cadáver a Príamo, rei de Tróia e pai de Heitor. O poema termina com os funerais do herói troiano. Alguns dos personagens da Ilíada, em particular Aquiles, encarnam o ideal heróico grego: a busca da honra ao preço do sacrifício, se necessário; o valor altruísta; a força descomunal mas não monstruosa; o patriotismo de Heitor; a fiel amizade de Pátroclo; a compaixão de Aquiles por Príamo, que o levou a restituir o cadáver de seu filho Heitor.
Nesse sentido, os heróis constituem um modelo, mas o poema mostra também suas fraquezas – paixões, egoísmo, orgulho, ódio desmedido. Toda a mitologia helênica, todo o Olimpo grego, com seus deuses, semideuses e deidades auxiliares, estão maravilhosamente descritos. Os deuses, que mostram vícios e virtudes humanas, intervêm constantemente no desenvolvimento da ação, alguns em favor dos aqueus, outros em apoio aos troianos. Zeus, o deus supremo do Olimpo, imparcial, intervém apenas quando o herói ultrapassa os limites, ao proporcionar o tenebroso espetáculo de passear à volta de Tróia arrastando o cadáver mutilado de Heitor.