Ora cen porta l’un de’ duri margini;
e ‘l fummo del ruscel di sopra aduggia,
si che dal foco salva l’acqua e li argini.
Canto XV ainda encontra os poetas no sétimo Círculo, em que ambos seguem viagem pelas margens elevadas do Flegetonte longe da chuva de fogo que caía sobre a areia. Ali Dante encontra um amigo, com quem conversa demoradamente e que prevê um futuro brilhante para o poeta.
“E ele então: se seguires a tua estrela, não falharás ao teu glorioso porto, se é que eu bem discerni na vida bela.”
O Canto XVI narra os dois poetas ainda nas encostas do monte protegidos da chuva de fogo, e mais uma vez Dante reconhece outros três personagens contemporâneos seus, faz menção de querer abraçá-los, mas a chuva de fogo que cai sobre os desgraçados o mantém afastado. “Mas, porque eu teria ardido e assado, fez-me o receio à intenção renunciar de abraçá-los, que eu tinha contemplado.” Pedem notícias de Florença e depois somem rapidamente.No Canto XVII surge Gerión, o símbolo da fraude, ser alado impressionante e que empesteia o mundo com sua presença. “… Eis a fera de cauda viperina, que montes, muros e armas desafia, e de peçonha o mundo contamina(…) Rápida, a cauda sua sibilava, volteando no ar a ponta bifurcada que, à guisa do escorpião, o golpe armava…”
Já no Canto XVIII e montados nas costas de Gerión, os poetas descem ao oitavo Círculo do Inferno. Aqui, distribuídos por dez valas ou bolsões distintos são punidos os fraudulentos. Numa, açoitados por demônios, encontram-se os rufiões e os sedutores; e noutra, imersos em fezes, os aduladores. “…É Taís, a rameira impenitente, que ouvindo de seu amante: Isto te agrada? lhe respondia – Agrada, imensamente!…”
Há neste Círculo oitavo outras valas e na terceira estão os simoníacos, ou traficantes de coisas sagradas, enterrados de cabeça para baixo e com os pés e as pernas de fora, evolvidos em chamas. Estamos então no Canto XIX e os versos aqui escritos incluem, inclusive, segundo historiadores, referências da vida pessoal de Dante, que fora acusado em sua juventude de ter danificado e profanado, com atos de vandalismo, o Batistério de São João na igreja de São João Batista em Florença, onde fora, ele mesmo, quando criança, batizado.
Gerión, simbolo da fraude, assola o mundo. Canto XVII.
O poeta, entretanto, se defendeu, dizendo que o que fizera na verdade fora salvar a vida de uma criança que ali caíra e corria, assim, o risco de se afogar. Neste canto e nesta vala está o Papa Nicolau III metido de cabeça para baixo numa estrita tumba ardente, agitando as suas pernas, que ficaram de fora envoltas em chamas, tentando chamar a atenção do poeta.
Já na quarta vala do oitavo Círculo, no Canto XX, os poetas divisam os mágicos, ilusionistas, adivinhos e outros embusteiros e intrujões, com os rostos transpostos ao contrário, ou seja, voltados para as costas, e sem poder olhar à frente caminhavam necessariamente, e possivelmente de forma desequilibrada, às avessas.”Examinando-as mais atentamente notei que para trás era tornado seu pescoço, portentosamente.”
Adiante, na quinta vala do oitavo Círculo do inferno, Canto XXI, os dois poetas vêem os funcionários públicos corruptos e venais, que praticaram tráfico de influências, prevaricadores e trapaceiros, todos mergulhados num poço de betume fervente. Mais uma vez Dante sente medo, pois Malacoda, um diabo diretor, que organizava a tortura por ali, instigado por seus inferiores tenta atacar Dante com seu tridente, no que é imediatamente detido por Virgílio que o convence a deixá-los continuar a viagem. “…Mas, ele lhes gritou: Quietos, eu digo!…”
No Canto XXII, ainda na quinta vala, os poetas observam uma alma tentando escapar e sendo recapturada por um demônio,“- tal o pato se vê que, espavorido, nas águas da laguna mergulhando, foge ao falcão, que volta, aborrecido.” Em seguida assistem dois outros demônios lutando entre si. Seguem pela sexta vala do oitavo Círculo, no Canto XXIII, e lá estão os hipócritas, que desfilam vestidos de chumbo por dentro e ouro por fora, um pesadíssimo e incômodo uniforme para carregar. “Ah! manto eterno, fatigante e rico! Nós os seguimos, pela esquerda entrando, ouvindo-os maldizer o estado inico.” Eles têm pressa, mas seu castigo é justamente o de não poderem ir mais rápido, dado o peso de seus mantos e a multidão que se aglomera arrastando-se lentamente à sua frente. Ali também, crucificado no chão, preso por pregos enormes está Caifaz, o hipócrita que no Sinédrio aconselhou os fariseus a condenarem Jesus. Os outros passam-lhe por sobre o corpo, pisando-o pesadamente.
Mais adiante, na sétima vala do mesmo círculo, já no Canto XXIV, estão os ladrões, que correm em meio a enormes serpentes e quando por elas são picados, entram em combustão, reduzindo-se a cinzas, para renascerem logo em seguida e novamente serem perseguidos e picados por enormes serpentes. “Nunca da Líbia os areais flamantes produziram tão pérfidas serpentes, jáculas, hidras, najas sibilantes…”
Chegamos ao Canto XXV – sétima vala do Círculo oitavo – onde as serpentes transformam-se em almas e depois ocorre o contrário, num círculo vicioso infindável, em que surgem criaturas de seis pernas ou braços, numa monstruosa união entre ladrões e serpentes, que se desfaz e se refaz, pena atribuída também aos que cometeram crime de peculato em Florença, cidade de Dante.“O resíduo da carne sobejando modelou-lhe o nariz na face plena, um pouco os lábios finos engrossando.”